“Eu Capitu”: espetáculo chega à São Luís para provocar reflexões pelo olhar feminino no teatro

15/08/2025 às 10:39 por Amanda Machado

Peça que já circulou pelo Brasil visa dar voz às mulheres em um mundo narrado por homens

Completando 125 de sua primeira publicação, o clássico Dom Casmurro, de Machado de Assis, terá uma releitura encenada na capital maranhense, na peça “Eu Capitu”. Com texto de Carla Faour e direção de Miwa Yanagizawa, o espetáculo visa dar voz às mulheres e traz à cena a história a partir da visão de Ana, uma menina prestes a entrar na adolescência, que vivencia o fim do relacionamento abusivo da mãe.

Em São Luís pela primeira vez, “Eu Capitu” terá apresentações nos dias 21, 22 e 23 de agosto, no Teatro Sesc Napoleão Ewerton (Av. dos Holandeses, Condomínio Fecomércio). No dia 21, a sessão será exclusiva para estudantes da rede pública de ensino, às 15h. E nos dias 22, às 20h, e 23, às 19h, serão apresentações abertas ao público e gratuitas. No sábado (23), a sessão será acessível com recurso de audiodescrição, para pessoas com deficiência visual, e tradução em Libras, para pessoas com deficiência auditiva. Os ingressos já estão esgotados, mas nas sessões disponibilizadas filas de espera, caso haja desistências.

O espetáculo vem como forma de alertar sobre o aumento nos casos de feminicídio, já que o Maranhão é uma das unidades da federação com o maior número de mortes de mulheres por questões de gênero, de acordo com Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Em 2024, o Maranhão teve um aumento de 99,7% em atendimentos realizados na Central de Atendimento à Mulher, o Ligue 180, dado que revela também o crescimento no número de mulheres vítimas de violência.

Para trazer a reflexão sobre esse tema, a obra lança mão de um olhar fantástico e atual para unir a ficção em cena à dura realidade das mulheres vítimas de violência.

“Logo de início, entendi que não queria uma peça realista. Se o assunto era muito duro e pesado, eu queria falar de uma forma doce e lúdica com a criação de um universo simbólico e metafórico.”, resume Carla Faour, que chama a atenção pelo fato de a peça dar voz a mulheres em um mundo que tem a narrativa masculina, seja na política, nas artes, na história ou nas famílias.

“Eu Capitu” foi aprovado na Seleção Petrobras Cultural e conta com recursos através da Lei Federal de Incentivo à Cultura, do Ministério da Cultura. A peça já foi apresentada em Brasília, Rio de Janeiro, Recife e Belo Horizonte, com lotação máxima, e depois de São Luís segue para Rio Branco, Porto Velho, Salvador, Fortaleza e Manaus.

O olhar feminino da obra de Machado de Assis

Em “Eu Capitu”, a menina Ana, interpretada pela atriz Mika Makino, tem por hábito se isolar em um mundo imaginário como forma de fugir dos problemas que enfrenta em casa. Sua mãe, Leninha, representada pela atriz Flavia Pyramo, vive um relacionamento abusivo com o marido. A tensão doméstica acaba por refletir no rendimento escolar da menina que precisa tirar boas notas em Literatura para não repetir o ano. A prova final vai ser baseada na obra Dom Casmurro, de Machado de Assis. No entanto, a leitura afeta diretamente a menina que passa a enxergar pontos em comum entre o livro e sua vida.

Em seu refúgio fantástico, Ana começa a misturar ficção com realidade e recebe a visita de uma mulher misteriosa, que tem o rosto parecido ao de sua mãe. Aos poucos descobrimos que esta mulher é Capitu, a personagem ícone da obra Machadiana. Nesses encontros, Ana dá voz àquela mulher que só conhecemos através do olhar masculino. A improvável ligação entre elas serve à menina, que está entrando na adolescência, como um rito de passagem para o universo feminino adulto, em que ela começa a entender o que significa ser mulher num mundo narrado por homens.
Esta é a história da produção que se baseia nas provocações sobre o original machadiano e reflete sobre machismo, dores e silenciamentos de mulheres contemporâneas.

“No palco, as atrizes encenam uma história que se passa no Brasil de hoje, quando Ana, adolescente presa em um ambiente de tensão doméstica, presencia o fim de um relacionamento abusivo de sua mãe. Para nós interessa instigar o olhar da plateia, convidá-la a imaginar outras possibilidades narrativas, tomar consciência das coisas se valendo de mais de uma perspectiva. Portanto, juntas, levantamos questionamentos e nos apropriamos deles para desdobrá-los ao invés de buscar soluções definitivas.”, ressalta a diretora Miwa Yanagizawa.

A peça foi idealizada pelo produtor Felipe Valle, após testemunhar indiretamente um episódio de violência doméstica em que não conseguiu intervir e teve a denúncia recusada pela polícia. O sentimento de impotência o levou intuitivamente a pensar em ‘Dom Casmurro’. Ao reler o livro com os olhos de agora, Valle percebeu toda a violência contida naquele clássico e resolveu trazê-lo para as luzes da ribalta pelo olhar feminino. “O convite para direção, escrita e encenação não foi à toa. São as mulheres que vão dar vida a esta história tão atual, eterna, cheia de nuances, simbolismos e de machismos do nosso sempre dia a dia”, pontua.

Serviço
O quê: Espetáculo “Eu Capitu” chega pela primeira vez a São Luís
Local: Sesc Teatro Napoleão Ewerton, Avenida dos Holandeses, Quadra 24, s/n, Condomínio Fecomércio/Sesc/Senac, Jardim Renascença II, São Luís
Datas:
21/08 – Sessão gratuita e exclusiva para estudantes da rede pública de ensino
22/08 – 20h – Sessão gratuita aberta ao público
23/08 – 19h – Sessão gratuita aberta ao público, com audiodescrição e tradução em Libras
Classificação: 14 anos
Duração: 90 min
Os ingressos já estão esgotados, mas nas sessões disponibilizadas filas de espera, caso haja desistências.